A última etapa de férias foi neste cantinho. Todos os dias tivémos este postal à janela enquanto preparavamos o jantar. Aqui consegue-se (ainda!) encontrar alguma paz, algum silêncio, alguma beleza selvagem. Felizmente não estivémos nos dias que concidiram com o Festival. Pelos testemunhos que ouvimos não só de pessoas que cá passavam férias, como também de pessoas que vivem cá, a vila torna-se um pequeno inferno!
Escápamos ao caos, mas sentimos uma tremenda invasão barulhenta e confusa de espanhóis.
Na praia, no café, nos bares, nos supemercados... espanhoooooooooiiisssssssssssssssss!!!!!! Aos magotes, em bandos, sempre com os botellons na mão e a música da Shakira no corpinho e no sorriso vitorioso e altamente perturbador.
Sagres é uma vila pacata, com alguma animação nocturna (pouca mas com qualidade!! e sobretudo com óptimo ambiente!), com praias lindas e para todos os gostos (surf, windsurf, aguas calmas, aguas revoltas...), com bons restaurantes. Para Sagres vão pessoas que procuram um bocadinho de tudo, mas sem artefícios, sem pseudo jet's, sem malta silly (*), procuram respirar principalmente, ouvir apenas o barulho do mar, apanhar umas ondas, ler um bom livro na praia, comer bom peixe, beber o melhor mojito à conversa com amigos de chinelo no pé!
Isto é Sagres. Uma vila bem portuguesa, virada para o mar nas suas diversas direcções, onde todos os estrangeiros são bem-vindos desde que respeitem o sítio e quem lá vive!
Nada parece manter-se assim perfeito e temo que se nada for feito, as belas praias de Sagres vão ser cada vez mais acampamentos selváticos de espanhóis que trazem a roulotte e as tendas gigantes e abancam sem que nada os impeça de sujar, fazer ruído, estragar o que ainda temos de tão belo e selvagem.
Li um artigo super realista, talvez até um pouco alarmista, mas que reflecte tudo o que eu vi e senti nesta última semana de férias..
Há que ler e fazer alguma coisa.
Selvagens nas dunas
Clara Ferreira Alves (www.expresso.pt)
0:00 Quinta feira, 19 de Agosto de 2010
Não dou cinco anos ao 'paraíso' da Costa Vicentina.
Já não é um segredo bem guardado. A Costa Vicentina é um dos últimos paraísos na terra. Pode ler-se em qualquer revista, brochura, folheto, guia. O desabrido oeste algarvio, batido pelos salgados ventos do Atlântico e os sopros do sul, que trazem de África a secura do deserto, começa a ser invadido. Invadido não só pelos operadores turísticos que insistem em contar o palmo de terra em "camas", 600 camas para aqui, 300 camas para ali (com a mercê do PIN, a mais sinistra invenção para atacar a paisagem protegida) mas também pelos turistas de caravana e tenda, avatares dos turistas de pé descalço. Em vez da mochila trazem uma casa ambulante, com estendal de roupa, tachos e panelas, mesas e cadeiras, lava-loiças, detergentes, latas e abre-latas, geleiras, garrafões, lençóis, baldes, duches. E trazem os cães. Muitos são alemães, muitos são espanhóis. Alguns ingleses e holandeses.
Percorrem as estradas da Europa naquelas casas de portento e chegam ao último paraíso. Entre a ponta de Sagres e Aljezur, o pedaço de paraíso onde costumo pousar, a praga do caravanismo e do campismo selvagem aumenta todos os anos. Invadem os parques de estacionamento da praia, ocupando dez lugares com a caravana, a mesa e cadeiras, as loiças sujas, as bicicletas, as pranchas de surf e a tralha. Estacionam nos melhores postos da falésia e ali ficam dias a fio, um verão inteiro, tapando o horizonte com as carripanas, bebericando cerveja e vinho ao pôr do sol, comendo latas de conserva e pão de plástico em fatias, trazido dos supermercados dos países onde habitam. Esta espécie de selvagens semeia à sua volta o lixo e a desordem e não gasta um tostão na aldeia ou no país que os acolhe sem cobrar. Os selvagens lavam a loiça na fonte da aldeia, deixando restos de detergente na água, entopem os caminhos e as dunas e nem chegam a conhecer a gente. Não frequentam restaurantes nem compram em lojas. Chegam, acampam, partem.
Os espanhóis são mais ousados do que os alemães e quejandos. Chegam com as litronas de cerveja e montam as tendas na praia, sobretudo nas praias não vigiadas e de difícil caminho, e por ali ficam, libertos de qualquer autoridade que corra com eles. As tendas são tendas beduínas, com metros de comprimento e cheias de comodidades. Uma das tendas serve de bar/restaurante. Vão espalhando o lixo na areia e na vegetação, defecando nas dunas, usando a paisagem como casa de férias. Grátis.
As autoridades portuguesas, com a tradicional bonomia, desorientação e incompetência, remetem umas para as outras a impossibilidade de travar a selvajaria. A polícia diz que não vale a pena multá-los porque eles não pagam e não existe um modo de os fazer pagar. Rasgam o auto. Uns dizem ainda que a lei europeia os impede de multar, uma fórmula inventada para nada fazer. Os da Conservação da Natureza e Biodiversidade, ICNB, chutam o problema para a autarquia e a autoridade, e a autarquia construiu o parque de estacionamento, como se isso a livrasse de responsabilidades. Um parque de estacionamento não é um parque de campismo selvagem. Resumo: ninguém mexe uma palha e Portugal oferece aquilo que qualquer país europeu regulamenta e faz pagar. Nenhum destes caravanistas e campistas ousaria fazer isto num dos parques e lagos da Alemanha ou nos parques de Espanha. Seriam removidos e multados.
Num passeio pelas dunas da praia do Amado verifiquei com os meus olhos os resíduos da selvajaria. Havia meia dúzia de tendas iguais às dos alpinistas, curvadas pela nortada, e duas tendas gigantes. Ao todo, uma vintena de selvagens caminhava por ali, nus ou com fatos de surf. A areia estava cheia de latas, garrafas vazias, restos de comida, sacos de plástico, pacotes de leite vazios, dejetos.
Em compensação, o português que era o concessionário do segundo bar da praia foi corrido do local pelos donos do terreno (privado) e até hoje impedido de assentar arraiais. Deram-lhe um cimo inóspito, junto dos carros, com cheiro a tubo de escape, sem água nem eletricidade, e onde nem um chapéu de sol se aguenta com o vento. Um gerador alimenta a caravana que serve de restaurante de praia, e o que era um bar decente e bem gerido, agradável à vista, abrigado, com comida decente e servido por gente decente, que beneficiava a praia e os que a usam decentemente, tornou-se... uma rulote. Parece que a única solução agradável para as autoridades, tão zelosas em repreender os portugueses e em vergar a espinha aos estrangeiros, foi o caravanismo obrigatório do restaurante.
O Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina está a ser ultimado. Vamos ver quantos anos vai esta região durar antes de chegarem os 'pinados' campos de golfe e os hotéis, as camionetas dos turistas de pacote, substituindo e matando o turismo rural que é o único adequado ao 'paraíso'. Não dou cinco anos ao 'paraíso'.Texto publicado na edição do Expresso de 14 de agosto de 2010
Clara Ferreira Alves (www.expresso.pt)
0:00 Quinta feira, 19 de Agosto de 2010
Não dou cinco anos ao 'paraíso' da Costa Vicentina.
Já não é um segredo bem guardado. A Costa Vicentina é um dos últimos paraísos na terra. Pode ler-se em qualquer revista, brochura, folheto, guia. O desabrido oeste algarvio, batido pelos salgados ventos do Atlântico e os sopros do sul, que trazem de África a secura do deserto, começa a ser invadido. Invadido não só pelos operadores turísticos que insistem em contar o palmo de terra em "camas", 600 camas para aqui, 300 camas para ali (com a mercê do PIN, a mais sinistra invenção para atacar a paisagem protegida) mas também pelos turistas de caravana e tenda, avatares dos turistas de pé descalço. Em vez da mochila trazem uma casa ambulante, com estendal de roupa, tachos e panelas, mesas e cadeiras, lava-loiças, detergentes, latas e abre-latas, geleiras, garrafões, lençóis, baldes, duches. E trazem os cães. Muitos são alemães, muitos são espanhóis. Alguns ingleses e holandeses.
Percorrem as estradas da Europa naquelas casas de portento e chegam ao último paraíso. Entre a ponta de Sagres e Aljezur, o pedaço de paraíso onde costumo pousar, a praga do caravanismo e do campismo selvagem aumenta todos os anos. Invadem os parques de estacionamento da praia, ocupando dez lugares com a caravana, a mesa e cadeiras, as loiças sujas, as bicicletas, as pranchas de surf e a tralha. Estacionam nos melhores postos da falésia e ali ficam dias a fio, um verão inteiro, tapando o horizonte com as carripanas, bebericando cerveja e vinho ao pôr do sol, comendo latas de conserva e pão de plástico em fatias, trazido dos supermercados dos países onde habitam. Esta espécie de selvagens semeia à sua volta o lixo e a desordem e não gasta um tostão na aldeia ou no país que os acolhe sem cobrar. Os selvagens lavam a loiça na fonte da aldeia, deixando restos de detergente na água, entopem os caminhos e as dunas e nem chegam a conhecer a gente. Não frequentam restaurantes nem compram em lojas. Chegam, acampam, partem.
Os espanhóis são mais ousados do que os alemães e quejandos. Chegam com as litronas de cerveja e montam as tendas na praia, sobretudo nas praias não vigiadas e de difícil caminho, e por ali ficam, libertos de qualquer autoridade que corra com eles. As tendas são tendas beduínas, com metros de comprimento e cheias de comodidades. Uma das tendas serve de bar/restaurante. Vão espalhando o lixo na areia e na vegetação, defecando nas dunas, usando a paisagem como casa de férias. Grátis.
As autoridades portuguesas, com a tradicional bonomia, desorientação e incompetência, remetem umas para as outras a impossibilidade de travar a selvajaria. A polícia diz que não vale a pena multá-los porque eles não pagam e não existe um modo de os fazer pagar. Rasgam o auto. Uns dizem ainda que a lei europeia os impede de multar, uma fórmula inventada para nada fazer. Os da Conservação da Natureza e Biodiversidade, ICNB, chutam o problema para a autarquia e a autoridade, e a autarquia construiu o parque de estacionamento, como se isso a livrasse de responsabilidades. Um parque de estacionamento não é um parque de campismo selvagem. Resumo: ninguém mexe uma palha e Portugal oferece aquilo que qualquer país europeu regulamenta e faz pagar. Nenhum destes caravanistas e campistas ousaria fazer isto num dos parques e lagos da Alemanha ou nos parques de Espanha. Seriam removidos e multados.
Num passeio pelas dunas da praia do Amado verifiquei com os meus olhos os resíduos da selvajaria. Havia meia dúzia de tendas iguais às dos alpinistas, curvadas pela nortada, e duas tendas gigantes. Ao todo, uma vintena de selvagens caminhava por ali, nus ou com fatos de surf. A areia estava cheia de latas, garrafas vazias, restos de comida, sacos de plástico, pacotes de leite vazios, dejetos.
Em compensação, o português que era o concessionário do segundo bar da praia foi corrido do local pelos donos do terreno (privado) e até hoje impedido de assentar arraiais. Deram-lhe um cimo inóspito, junto dos carros, com cheiro a tubo de escape, sem água nem eletricidade, e onde nem um chapéu de sol se aguenta com o vento. Um gerador alimenta a caravana que serve de restaurante de praia, e o que era um bar decente e bem gerido, agradável à vista, abrigado, com comida decente e servido por gente decente, que beneficiava a praia e os que a usam decentemente, tornou-se... uma rulote. Parece que a única solução agradável para as autoridades, tão zelosas em repreender os portugueses e em vergar a espinha aos estrangeiros, foi o caravanismo obrigatório do restaurante.
O Plano de Ordenamento do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e da Costa Vicentina está a ser ultimado. Vamos ver quantos anos vai esta região durar antes de chegarem os 'pinados' campos de golfe e os hotéis, as camionetas dos turistas de pacote, substituindo e matando o turismo rural que é o único adequado ao 'paraíso'. Não dou cinco anos ao 'paraíso'.Texto publicado na edição do Expresso de 14 de agosto de 2010
1 comentário:
Támbém li o artigo do Expresso e confesso que fiquei iradíssima.
Os espanhóis tb têm feito cenas dessas aqui no Meko.
Só se vê é lixo espanhol, garrafas de cerveza, zumos de manzana, tudo é deixado por onde passam...gentinha de baixo nível de educação!
Bjo
Malu
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