terça-feira, 21 de julho de 2009

As barracas da minha praia


Sinto o frio húmido misturado com o cheiro salgado da espuma que vem do mar.. O cheiro dos papossecos crocantes e quentes com manteiga e o café com leite sabiam a manjares e jamais aqueles sabores souberam tão bem como naquela época. A casa era grande mas nossa... Da varanda viamos ao longe o horizonte e na expectativa imaginávamos sempre de que cor estaria a bandeira que ditava as regras na praia..

Descia aquela rua de uma felicidade e de uma liberdade que nunca mais senti.

A minha praia era feita de barracas coloridas com paus com números e cores.

A nossa era sempre a 30, de paus amarelos e tecido às riscas...a dona Adelina vinha descalça com as suas sete saias e os seus brincos de ouro abrir a barraca ainda meio húmida da noite que tinha ido embora e dava lugar ao dia que amanhecia envergonhado e enublado...Normalmente ficávamos na última barraca da fila, mais perto do mar, para "o avô ver os garotos que não são de fiar..." e era desta forma que corríamos sem medos para as àguas frias daquele mar nazareno que nos esperava com bandeira verde, sempre a ameaçar para o amarelo...

"o mar é nosso!!" - diziam os miúdos da praia que corriam e molhavam tudo e todos, mesmo aqueles que a tiritar só o pé queriam refrescar...

Mas o mar era de todos, pensava eu... e aquele era quase também um bocadinho meu. Mal eu sonhava que faria parte de mim como se de uma tatuagem se tratasse.

Foi nele que aprendi a nadar, foi nele que me enrolei vezes sem conta, foi nele que me inspirei, foi dele que tive saudades o ano todo, foi por ele que suspirei os primeiros amores de verão, foi com aquele mar como cenário que disse que seria para sempre a quem amo.... Aquele mar também é um pouco meu..

As barracas da minha praia trazem saudades da inocência de verões longos e salgados que eram feitos de bolacha americana, lábios roxos de frio, matinés de cinema, gelados da Conchanata, músicas de verão no S.Miguel, beijinhos escondidos no Pé-Leve, infindáveis pôres do sol atrás do Guilhim..

A minha praia é feita de barracas de cores e sonhos longínquos.

A ela voltarei sempre que posso, deixando-me levar pelas recordações que fazem dela a minha praia de sonhos e desejos, a minha praia de barracas feita..

2 comentários:

Paulo disse...

... e não é que senti o cheiro do mar, o sabor da bolacha americana e as saudades das matinés dançantes
(noutro tempo, noutras paragens):)
Parabéns pelo texto.

ineXpress disse...

ESPETÁCULO!!! que excelente momento me deste agora mesmo depois de ler isto. (Re)Lembrar que a barraca era religiosamente aberta todas as manhãs já não me lembrava.. e as carreiras que acabavam em máquinas de lavar que nunca sabias qd iam acabar, os Klandestinos, A sr. Lurdes, as toiletes para ir sair à noite, o momento fantástico em que as marés vivas estavam a começar e o mar já só recebia os nazarenos que se benziam antes de dar mergulhos acrobáticos... and so one and one and one!